28 março 2012

A mesma canção

O Grito - Edvard Munch

E canta essa dor, o poeta
Hospedeira e parasita
Tal qual a lombriga
Que as tripas habitam
Solitariamente
Sugadoramente.

Que percorre a alma
Como o sangue a nutrir
Como o veneno a alastrar-se
-  célula à célula – sem dó
Como a morte a domar cada parte de si.

Essa dor que havia dormido
Havia calado
Hoje seqüestra
Prende, emudece
A quem te escondia
E te prendia
E te caçava
Como quem caça um demônio.

O poeta canta sua dor
Como quem pede um sossego
Como quem clama
E anuncia suas fúrias
Suas feras, seus fantasmas.

O poeta canta sua dor
Num assovio de
Pássaro engaiolado
Num grunhido
De animal enjaulado
De bicho qualquer em correntes, acuado.

Não perguntes o que falta
O que queres ou o que sentes.
Não perguntes de onde vem
Porque vem, como nasce.
Nada pergunte.
Não há resposta a dar, nem disto carece.
Sequer o ouça.
Nada há por ele nada a fazer ou dizer.
O poeta tem todas as respostas e pouca vontade.

Dê-lhe o tempo
Dê-lhe o silêncio presente.
Dê-lhe asas
Descubra-o.
Desvende-o
Percorra-o.
Tão somente se o quiser.
Acompanhe sua dor.
Não. Não a tome pra si.
Apenas permita-o.
Senão.
Deixe-o. Só.
Disso, já se bem entende.


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