![]() |
O Grito - Edvard Munch |
E canta essa dor, o poeta
Hospedeira e parasita
Tal qual a lombriga
Que as tripas habitam
Solitariamente
Sugadoramente.
Que percorre a alma
Como o sangue a nutrir
Como o veneno a alastrar-se
-
célula à célula – sem dó
Como a morte a domar cada parte de si.
Essa dor que havia dormido
Havia calado
Hoje seqüestra
Prende, emudece
A quem te escondia
E te prendia
E te caçava
Como quem caça um demônio.
O poeta canta sua dor
Como quem pede um sossego
Como quem clama
E anuncia suas fúrias
Suas feras, seus fantasmas.
O poeta canta sua dor
Num assovio de
Pássaro engaiolado
Num grunhido
De animal enjaulado
De bicho qualquer em correntes,
acuado.
Não perguntes o que falta
O que queres ou o que sentes.
Não perguntes de onde vem
Porque vem, como nasce.
Nada pergunte.
Não há resposta a dar, nem disto
carece.
Sequer o ouça.
Nada há por ele nada a fazer ou dizer.
O poeta tem todas as respostas e pouca
vontade.
Dê-lhe o tempo
Dê-lhe o silêncio presente.
Dê-lhe asas
Descubra-o.
Desvende-o
Percorra-o.
Tão somente se o quiser.
Acompanhe sua dor.
Não. Não a tome pra si.
Apenas permita-o.
Senão.
Deixe-o. Só.
Disso,
já se bem entende.